“Não Podemos Desanimar ou Aquilo Que Fazemos Perde Sentido" - VIDA DE BOMBEIRO

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domingo, 9 de agosto de 2020

“Não Podemos Desanimar ou Aquilo Que Fazemos Perde Sentido"


Se uns viram as suas vidas estagnadas com a chegada de um vírus que se tornou uma preocupação global, outros chegaram-se à frente com a nobre missão de cuidar. Uma bombeira, uma enfermeira, uma piloto, uma chef, uma comissária da PSP contam-nos as suas histórias da pandemia.

Idolatrados como heróis sempre que existem períodos de incêndios em Portugal, como foi o caso do verão ardente de 2017, os bombeiros também são uma das forças na linha da frente da pandemia originada pelo novo coronavírus. 

Incansáveis, são eles que muitas vezes se deslocam às casas das pessoas para fazer o rastreio, e descartar, ou não, hipóteses de contágio. E se pensarmos que são os bombeiros que em contexto de maiores desgraças decidem, muitas vezes, aquilo que é preciso ver e fazer para que outros depois possam cuidar, facilmente nos conquistam pelo respeito e pela dedicação com que abraçam a sua missão.

Com um discurso humilde que revela alguém que gosta genuinamente daquilo que faz, Rita Faria, 32 anos e natural de Vimieiro, concelho de Arraiolos, é membro da corporação dos bombeiros de Arraiolos desde os 15 anos. Primeiro como voluntária, depois como bombeira residente, mais de metade da sua vida foi passada numa profissão marcada pela iminência, pelo desconhecido em relação ao minuto seguinte e pelo perigo constante. "Foi algo que sempre quis ser desde pequenina, até que fiz a inscrição. Já era uma coisa de que gostava, e que foi crescendo em mim" recorda.

Durante a nossa conversa, imaginamo-la dentro de um dos fatos de Kit Covid-19 Socorrista, como assim se chamam os EPI dos Bombeiros, debaixo dos 40 graus que se fazem sentir no Alentejo interior. A trabalhar em regime laboral de urgência, Rita confessa que "quando se entra de manhã, nunca se sabe o que vai encontrar durante o dia. E nenhum serviço é igual ao outro."

Em março, foi quando a sua coorporação, a dos Bombeiros Voluntários de Arraiolos, sentiu mais a necessidade de se "adaptar à nova realidade", o que significou dividirem-se por equipas e fazer turnos de 24h, alterando-se também as rotinas. "Além dos fatos que já usávamos e das luvas, tivemos que nos adaptar às máscaras, às batas, e quando há suspeitas [de covid-19] juntam-se muito mais elementos, como fatos-macaco, tapa-botas, toucas, viseiras e óculos de proteção."

Apesar de na região ter havido alguns casos de covid-19 suspeitos, o primeiro caso confirmado surgiu apenas no início de julho, dando origem a um contágio de uma família inteira. "Inicialmente as pessoas estavam mais resguardadas, depois do levantamento do estado de emergência as pessoas começaram a sair mais. Fizemos algumas triagens, mediamos a temperatura, víamos a tosse, a falta de ar…" explica, sobre a nova realidade desta profissão. "Depois dos primeiros casos positivos, as pessoas acabaram por se resguardar mais", acrescenta. Sempre que vê ajuntamentos na rua, "quando é alguém conhecido acabo por alertar. Mas é frustrante, pensar que andamos aqui a tentar que as coisas corram bem e ali ao lado é como se estivesse tudo muito bem."

Pessoalmente, também a vida de Rita sofreu algumas transformações, sobretudo por ter uma filha pequena, de oito anos. "No dia a dia já temos sempre receio porque nunca sabemos o que nos espera, como tenho uma filha pequena, os beijinhos e os abraços vão ter que ficar para daqui a uns tempos."

Sobre o facto de tanto serem chamados de heróis como serem facilmente "esquecidos", Rita acredita que isso se deve a algumas pessoas acharem que "levamos isto como um passatempo, e que vamos dentro de uma ambulância e não se passa lá nada. Muitas vezes, quando saímos do quartel a saber que a situação é mais grave, vamos mais depressa. Claro que as pessoas dizem muitas vezes que gostamos de andar depressa, e isso não é verdade."

Este ano, aos habituais incêndios, junta-se a covid-19. "Temos que pensar: calma, temos um incêndio para apagar mas também temos que nos proteger do resto. É uma dupla preocupação." Otimista, apesar de achar que a covid-19 ainda vai ser um problema nos próximos meses, Rita Faria reforça que tem esperança que as coisas melhorem. "Não podemos desanimar, até porque no dia em que acharmos que não vai ser assim, acaba por não fazer sentido aquilo que fazemos."

Fonte: Máxima

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