Sacudir o Fogo do Capote - VIDA DE BOMBEIRO

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sexta-feira, 26 de julho de 2019

Sacudir o Fogo do Capote


Voltaram os incêndios em força, a recordar 2017, e logo em dois dias seguidos desta semana o país assistiu, enquanto a floresta ainda fumegava, a declarações do Governo a atribuir responsabilidades e culpas nessa matéria a presidentes de Câmara.

António Costa primeiro, perguntado pelas medidas de prevenção e combate a incêndios, limitou-se a remeter para competências municipais; o ministro da Administração Interna, no dia seguinte, fez um ataque ao presidente da Câmara de Mação por ter sido "verdadeiro comentador televisivo" e fazer uma "provocação", em vez de "promover a ativação do Plano Municipal de Emergência" e a "cooperação a favor do esforço da Proteção Civil".

São declarações que causam surpresa, estupefação até, e inaceitáveis a vários títulos.

Em primeiro lugar, por quebrarem a regra, sublinhada e observada por exemplo pelo presidente da República, de não passar à discussão das culpas e responsabilidades enquanto o rescaldo do incêndio ainda decorre.

Em segundo lugar, por mostrarem a preocupação em alijar responsabilidades e atribuir culpas a outrem, que não ao Governo, em vez da necessária solidariedade e generosidade para com as populações afetadas, as quais, como todos puderam ver, ficam muitas vezes sós a combater o fogo.

Em terceiro lugar, porque a troca de acusações nas televisões entre responsáveis democraticamente eleitos, a propósito de acontecimentos que causam grandes perdas e sofrimento, é um espetáculo deplorável, que acentua a sensação de vulnerabilidade e de carência de proteção das populações, a qual deveria ser contrariada pela concentração nas medidas de prevenção e combate aos incêndios.

Em quarto lugar, porque, pelo menos em parte, são declarações improcedentes, assentando na confusão entre competências para prevenção dos incêndios e para o seu combate, e na ideia, falsa, de que as medidas previstas no Plano Municipal de Emergência em Mação não teriam sido logo ativadas pelo município.

Em quinto lugar, porque essas declarações, além de demonstrarem uma inaceitável intolerância em relação a críticas, desviam a atenção de eventuais falhas na prevenção (por exemplo, com avanços no cadastro e identificação dos prédios, ainda esta semana considerados insuficientes pelo presidente da República) e combate aos incêndios, apesar das duas tragédias de há dois anos.

E sobretudo, são declarações lamentáveis - mas também elucidativas - porque trazem a marca de quem se preocupa sobretudo com os efeitos na perceção pública da responsabilização política pelos incêndios, em vez de com a preparação da prevenção e do combate aos incêndios. Uma marca indelével e característica, que nem toda a habilidade política, tática e mediática consegue disfarçar e que os cidadãos (autarcas e munícipes) também percebem bem.

Paulo Mota Pinto in JN

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