"Quando Soa a Sirene" - VIDA DE BOMBEIRO

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segunda-feira, 23 de outubro de 2017

"Quando Soa a Sirene"


Existem pessoas que vêm diariamente a sua imagem reflectida nos olhos dos que em desespero chamam por ajuda. Existem pessoas que não poupam sacrifícios no cumprimento das suas funções, do seu dever.

Estas pessoas poderiam ser chamados de heróis, mas eu prefiro chamá-las na primeira pessoa pelos seus próprios nomes.

Para ostentar esta farda é preciso ter muito mais do que sonhos, é preciso coragem para ir onde ninguém quer ir, para colocar em risco a própria vida por pessoas que nunca se viu antes.

Para ser bombeiro o corpo precisa estar treinado e saber que não há diferença entre a madrugada fria ou o verão quente e todos se igualam ao som das sirenes quando o alarme soa.

É preciso saber que não se vai ficar rico, que os fracassos serão fantasmas que nos vão perseguir para sempre quando deitas a cabeça na almofada, e o sucesso são nuvens que se dissipam a cada amanhecer. É preciso ser totalmente abnegado, um apaixonado pelo que faz, pois mesmo diante dos piores momentos, de todos os muitos bombeiros que tenho vindo a conhecer, nunca vi algum que tenha por um só minuto se arrependido da escolha que fez.

Porque ser bombeiro, é esquecer o mundo lá fora, é salvar desconhecidos com o mesmo carinho com que se abraça um amigo, é contrariar o desespero das vítimas contendo as próprias lágrimas.

Seria injusto dizer que trabalhamos à troca de nada. Pois qualquer um de nós sabe apreciar as recompensas que nos dá esta nobre profissão, quer na formação disciplina e treino que recebemos, quer na felicidade de uma mãe que deu à luz, o entusiasmo com que um idoso nos conta a sua história e lição de vida, uma palavra, uma lágrima ou um abraço de agradecimento. 

Não, nós não somos super heróis porque não temos poderes mágicos, nem somos anjos porque não temos asas, não somos inconscientes porque sabemos os riscos que corremos, somos por baixo da fibra desta farda humanos de carne e osso, e também temos medos, sentimentos etc... Sentimos a dor da família das vítimas que não podemos salvar, sentimos a dor dos que já vimos partir.

Gostava que pudesses ter a noção da tristeza de um homem quando o trabalho de uma vida desaparece em chamas, ou uma família que regressa de viagem e apenas encontra a sua casa e todos os seus bens destruídos.

Gostava que pudesses saber o que é procurar por uma vítima num complexo completamente incendiado mesmo com as chamas por cima da tua cabeça, as palmas das mãos e os joelhos a queimarem enquanto rastejas por entre a fumaça densa com o pensamento fixo que se não fores tu mais ninguém poderá salvar quem lá está, sentir o chão a ranger com o teu peso enquanto o edifício arde mesmo por baixo de ti (Ainda que este cenário seja em contexto formativo).

Gostava que pudesses saber como é entrar em casa e olhar para tua família depois de teres estado a centenas de quilómetros de casa em campos cinzentos e não ter coragem para lhes dizer que quase ficavas lá.

Gostava que pudesses compreender como é quando temos uma vítima a puxar-nos o braço e a perguntar se os restantes estão bem, e sem sequer conseguires olhar-lhe nos olhos nem saberes o que responder.

Agora eu pergunto-vos, o que seria do mundo sem os bombeiros? 

Reflexão by Mário Almeida.

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