Ramos desconhecem moldes do novo papel dos militares nos fogos
As Forças Armadas (FA) estão prontas para responder ao reforço do seu papel nos incêndios, em apoio das autoridades civis e nos termos anunciados sábado pelo chefe do Governo. Contudo, ignoram como é que isso se vai traduzir em concreto, sabendo-se que mais missões implicam um reforço de meios humanos, materiais e financeiros.
António Costa, após uma tragédia que vitimou mais de 100 pessoas, anunciou que as FA vão ter "um papel alargado [...] nas ações de rescaldo, na parte logística, no auxílio junto das populações e, ainda, no que respeita às capacidades no apoio ao processo de decisão" - leia-se Exército e Marinha. A Força Aérea "ficará com a gestão e operação dos meios aéreos de combate aos incêndios florestais", abrangendo meios do ramo - como os novos helicópteros ligeiros e as futuras aeronaves KC-390 - e ainda "a gestão dos meios próprios do Estado e a gestão dos contratos de meios aéreos de combate aos incêndios".
Fontes oficiais dos ramos disseram ao DN desconhecer os moldes desse envolvimento. Já as associações profissionais de Oficiais (AOFA) e Sargentos (ANS), manifestando a sua satisfação por verem concretizar-se uma medida há muito reclamada, alertam para a necessidade de saber em que termos e com que meios adicionais.
O tenente-general Frutuoso Pires Mateus, autor da proposta para criar uma unidade militar conjunta de emergências, disse que as medidas "são um princípio". Por exemplo, importa que a formação dos militares, desde as academias às recrutas, passe a incluir "esta área da Proteção Civil".
António Mota, presidente da AOFA, mostrou-se taxativo: "O RAME teria de ser reforçado. Vemos com grande perplexidade a questão dos meios humanos, que já não tem, e os meios logísticos e financeiros para que não recaia sobre a Forças Armadas o ónus de uma missão menos bem cumprida." "A Força Aérea e as FA em geral não têm meios humanos necessários em quantidade e preparados para o combate aos incêndios", insistiu aquele tenente-coronel.
"Se já hoje não temos recursos humanos para dar resposta às missões pedidas, vemos com grande perplexidade" conseguir fazê-lo com o que há. "Não se vão atribuir missões muito exigentes e de grande responsabilidade sem acautelar o reforço substancial dos meios humanos", defendeu ainda António Mota, adiantando: "Vemos como positivo que o RAME passe a ter meios permanentes e dedicados ao apoio e gestão de catástrofes, pois isto não passa só por incêndios mas também cheias e tremores de terra."
O presidente da ANS, Mário Ramos, focou a questão de saber "de que forma e com que meios" vai concretizar-se o reforço das FA. Na memória está a promessa não cumprida da Proteção Civil de dar "fatos, botas, máscaras e capacetes" para os militares estarem devidamente equipados - pelo que foram para o terreno "com fardas e as botas do dia a dia", estas "a derreter".
Lima Coelho, diretor do jornal "O Sargento", disse que "deve ser tudo devidamente enquadrado e bem preparado para não se entrar em aventureirismos e não voltar a ter dramas como o de Sintra" (em 1966, onde morreram 25 militares). "Tem de haver preparação, reequipamento e reestruturação" sobre a forma como os militares atuam, alertou, evocando a unidade militar espanhola que esteve em Portugal: eram "mais de 100 homens comandados por um sargento e deram um exemplo brutal do que são as capacidades militares, quando preparados e orientados para esse efeito".
Quem se mostrou desagradado com a ausência de diálogo prévio do Governo foi o líder da Liga dos Bombeiros. "Parece que o sistema faliu porque os bombeiros [voluntários] não foram capazes e agora se tem de ir para o profissionalismo", lamentou Jaime Marta Soares. "Estamos disponíveis para ter corpos mistos com profissionais", a começar pela integração dos que estão na Proteção Civil (os Canarinhos), disse.
"Queremos saber o porquê de ter estruturas profissionais quando não se esgotaram as possibilidades de ter equipas mistas com profissionais nos bombeiros", insistiu.
Fonte: DN
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