Uma anomalia no sistema imunológico, que originalmente tem a função de proteger o organismo de invasores externos, pode estar na origem da doença de Alzheimer. A conclusão é de um novo estudo realizado por cientistas da Universidade de Duke, nos EUA, que também sugere uma nova estratégia para o tratamento da forma mais comum de demência no planeta.
O estudo, publicado terça-feira no «Journal of Neuroscience», mostra que, nos indivíduos com Alzheimer, certas células do sistema imunológico começam a consumir de forma anormal um importante nutriente, a arginina, diminuindo a presença no cérebro e desencadeando a doença.
A partir de uma experiência com ratinhos, os pesquisadores mostraram que é possível bloquear aquele processo com uma droga e reverter nos animais a perda de memória causada pelo Alzheimer.
De acordo com os autores, cada vez mais evidências indicam que o sistema imunológico tem um papel na doença de Alzheimer, mas a influência exata ainda permanece um mistério.
No novo estudo, os investigadores conseguiram demonstrar que a falta de arginina, um aminoácido presente na maior parte das proteínas do organismo, afeta diretamente a evolução da doença.
«Se o consumo de arginina é tão importante para o processo do Alzheimer, talvez nós possamos bloquear esse consumo e reverter a doença», disse uma das autoras do estudo, Carol Colton, da Escola de Medicina da Universidade de Duke, citada pelo jornal britânico «The Independent».
Os ratinhos utilizados na pesquisa, criados há alguns anos para permitir o estudo da doença, tiveram alguns genes alterados para que o sistema imunológico se tornasse semelhante ao humano. Além disso, os animais foram manipulados para apresentar as principais características dos portadores de Alzheimer: perda de neurónios, mudanças de comportamento e a presença, no cérebro, de placas e emaranhados de certas proteínas.
Ao longo da vida dos ratinhos, os cientistas procuraram anomalias imunológicas e constataram que a maior parte dos componentes do sistema imunológico não apresentava mudanças quantitativas. A exceção foi um tipo de células imunológicas conhecidas como micróglias, que geralmente são as primeiras células a responder à doença de Alzheimer.
Isolando essas células e analisando a sua atividade genética, os cientistas observaram um aumento na expressão dos genes associados à supressão do sistema imunológico - isto é, que diminuem a sua atividade.
«Isso é surpreendente porque a supressão do sistema imunológico não é o que pensávamos que acontecia na doença de Alzheimer», afirmou o autor principal do estudo, Matthew Kan, pós-doutorando no laboratório de Colton.
De acordo com Matthew Kan, antes do estudo, os cientistas pensavam que acontecia justamente o contrário: o cérebro libertaria moléculas envolvidas na construção do sistema imunológico, que deveriam exacerbar a sua ação, danificando o cérebro. Com a modificação na micróglia, os pesquisadores verificaram um grande aumento da presença de arginase - uma enzima que quebra as moléculas de arginina - nas regiões cerebrais relacionadas com a memória, nas mesmas áreas onde havia morte de neurónios.
Os investigadores verificaram que, com o aumento da arginase, a micróglia consome uma quantidade exagerada de arginina. Os cientistas bloquearam a ação da arginase usando uma droga conhecida como DFMO, antes de os sintomas se manifestarem nos ratinhos. Observaram então uma redução das modificações na micróglia e do desenvolvimento de placas nas proteínas cerebrais. Além disso, os ratinhos saíram-se melhor em testes de memória.
«Tudo isso sugere que se nós conseguirmos bloquear esse processo local de privação de arginina, podemos proteger - os ratos, pelo menos - da doença de Alzheimer», disse Matthew Kan. O DFMO foi sintetizado há 20 anos e tem sido estudado em testes clínicos com humanos para o tratamento de alguns tipos de cancro. Mas a droga ainda não tinha sido testada como potencial terapia para a doença de Alzheimer.
No estudo, o grupo de Colton administrou o fármaco antes dos sintomas aparecerem. Agora, pretendem estudar se o DFMO pode tratar as consequências do Alzheimer antes que elas apareçam.
De acordo com Carol Colton, embora tenha sido constatado que a carência de arginina está ligada à doença de Alzheimer, a ingestão de suplementos do aminoácido não é uma alternativa para a prevenção. É que uma densa massa de células e de vasos sanguíneos determina a quantidade de arginina que entra no cérebro. Assim, mesmo que um paciente coma mais arginina, nada garante que ela vá para os locais do cérebro que precisam do aminoácido.
Fonte: TVI 24