“Entre o amor dos meus filhos e a paixão dos bombeiros” - VIDA DE BOMBEIRO

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sábado, 11 de janeiro de 2014

“Entre o amor dos meus filhos e a paixão dos bombeiros”



À janela de minha casa, espero que baixe a febre ao Rodrigo, o meu filho de dois anos. A Daniela, minha esposa, verifica que o Pedro de sete anos, continua a dormir. É quase meia-noite e na rua não há vivalma. Vejo, ao longe, a cruz no cimo da igreja de Sto António.
Essa cruz acompanha-me e confirma, na placidez desta noite quente, que não estamos sós nesta aventura. Amanhã pela manhã teremos que ver quem fica a tratar do menino, porque não poderei ser eu. Espera-me outra jornada de trabalho no corpo de bombeiros, onde estou há alguns anos. 
Anima-me pensar que todos os que trabalham nesta vida estão a colaborar com esses companheiros que enfrentam o fogo e em tantas ocasiões, salvam a vida de pessoas como eu. 
Durante o trabalho, ligarei para saber como está o meu menino. Ao terminar o trabalho, vou à escola buscar o mais velho para começar outra jornada diferente. Substituirei o fogo e as mangueiras pelos brinquedos e pelo biberão. 
Recordo umas palavras de uma homilia que assisti recentemente, Amar o mundo apaixonadamente: “É a vida corrente o verdadeiro lugar da nossa existência… onde estão as vossas aspirações, o vosso trabalho, os vossos amores, esse é o sítio do vosso encontro quotidiano com o próximo. É no meio das coisas mais materiais da terra, onde devemos santificar-nos servindo a Deus e a todos os homens”. 

Aprendi que esse deve ser o único fim da minha vida: amar. 
Com essa perspectiva, tudo tem sentido. Quando se trabalha por amor, o esforço vale a pena, tudo o que faço pela minha família e o meu trabalho, que me encanta. 
Continuo a olhar pela janela e a controlar a febre. 
Em muitos desses edifícios que agora recortam a paisagem à luz da lua, talvez haja muitos homens como eu, que caminham pela casa com o termómetro na mão, procurando não fazer barulho. E peço a Deus que também eles encontrem nas suas vidas esta luz interior que Deus me deu.


Gostava que as pessoas entendessem que nós, bombeiros, somos humanos, falhamos, erramos e não temos força infinita. 
Às vezes saímos de rastos dos treinos, todos suados, esgotados, e no fim os nossos instrutores dizem sempre que não treinamos por castigo nem porque queremos, mas sim porque o ofício assim o obriga, porque ser bombeiro não é só vestir uma farda, é saber usá-la em função dos outros. Porque quem não aguenta um treino não aguenta um incêndio de grandes dimensões ou um desencarceramento.
Por vezes dá-me vontade de chorar quando vejo as capas dos jornais e as notícias na TV. Apetece-me chorar por saber o que eles estão a passar e por não poder estar lá a ajudar, porque se pudesse transferia todas as minhas forças. 
Não é fácil ser bombeiro, passamos por muita coisa , vemos muita coisa e temos grandes responsabilidades.  Mas o que mais me custa é por vezes ver a população a lembrar-se dos bombeiros apenas na hora de aperto e mesmo assim, à nossa chegada ainda sermos ameaçados. Sim, é verdade, já houve várias situações onde fomos socorrer e à chegada fomos ameaçados pela população. Mas também há pessoas generosas que nos dão alimentos, e até nos ajudam a combater a chamas. 
Gostava que as pessoas entendessem que nós, bombeiros, somos humanos, falhamos, erramos e não temos força infinita, que não temos descanso e muitas vezes vamos para a ocorrência e deixamos os filhos em casa a chorar por verem os pais irem para a frente de um inferno de fumo e calor. 
Há pessoas que não têm mesmo noção do que é ser bombeiro. E não é por falta de treino, por vezes pode ser por falta de veículos - e não falo só em veículos terrestres. 

Não é fácil ir contra as chamas quando muitos fogem delas , não é mesmo nada  fácil... 

Ser bombeiro não é só andar de ambulância nem apenas largar a água contra as chamas. Ser bombeiro é difícil, muito difícil, mas também é um orgulho." 

E é por isso e muito mais, que deixamos a nossa família em casa com o coração nas mãos, para socorrer quem precisa. 


Pense nisso antes de nos criticar…

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