Jovem de 16 anos, morre atropelada - VIDA DE BOMBEIRO

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sábado, 19 de outubro de 2013

Jovem de 16 anos, morre atropelada


29 de Outubro de 2010

Sexta feira, final de tarde e tinha chovido durante todo o dia. Eram quase sete da tarde quando o telefone tocou, lá fora, a chuva continuava a cair, e o dia  tinha dado lugar à noite. Estávamos quase em Novembro e os dias já eram muito mais "curtos" o que fazia com que a noite chegasse mais cedo.
Praticamente já estávamos há espera que chegasse a hora de ir embora, mas não foi isso que aconteceu, do outro lado do telefone chegava a indicação de um atropelamento duplo em S. Miguel de Paredes junto à clínica da Precur.
Rapidamente avançamos para o local em duas viaturas, pelo caminho ia dizendo ao meu camarada (Filipe Neves), o que me ia no pensamento "não sei porquê mas acho que vamos encontrar tenda", e infelizmente não me enganei.



Quando chegamos ao local depara-mo-nos com duas vitimas caídas, que tinham sido projectadas alguns metros, fiz um rápido reconhecimento sobre as duas jovens e demos inicio ao socorro a uma delas.
Rapidamente coloquei todo o material de trauma junto da nossa vitima, e enquanto isso já outra equipa começava a socorrer a outra jovem.
Olhei de relance à nossa volta e o aparato era enorme, dezenas de pessoas para não dizer centenas, encontravam-se ali a observar o que se passava, consegui perceber entre comentários de terceiros, que as duas jovens ao atravessar a estrada houve uma viatura que parou para elas passarem mas uma outra viatura não as viu e embateu contra elas com grande violência.


Infelizmente os ferimentos eram graves, muito graves, imobilizamos a nossa vitima e coloca-mo-la  dentro da viatura, ao longe já conseguia ouvir o barulho da sirene da viatura médica, e dei por mim a pensar, "oxalá cheguem rápido pois precisamos aqui de ajuda".
A nossa vitima encontrava-se muito mal tratada, com TCE grave, suspeita de TVM, fracturas múltiplas e várias feridas abertas.
Felizmente para nós e para a nossa vitima a médica dirigiu-se para nós, transmiti-lhe todos os dados que dispúnhamos, reajustamos a imobilização e logo de seguida a Dra  Sílvia começou a administrar fármacos na nossa vitima, deu-nos a indicação do que tinha que ser feito durante o transporte até ao hospital, e chamou-me a atenção uma dessas indicações em que nos disse, "vão o mais rápido possível, mas devagar".
Sei que para muita gente pode parecer confuso, mas eu percebi perfeitamente o que nos estava a dizer, pois dada a gravidade da situação, a nossa vitima precisava de cuidados hospitalares urgentes, mas acima de tudo precisava de chegar ao hospital para receber esses mesmos cuidados.


Passados alguns minutos, já  a equipa medica se encontrava a socorrer a outra vitima, e nós dávamos inicio à nossa viagem para o hospital, na maca tínhamos uma jovem de 16 anos, inconsciente, com um prognostico muito reservado, no hospital já se encontravam à nossa espera, e então eu ia andando o mais que podia para poder chegar o mais rápido possível. Não foi uma viagem fácil, a chuva teimava em cair com alguma intensidade o que tornava a nossa viagem muito mais perigosa, sempre que podia acelerava nas rectas, mas quando chegava a uma curva, tentava sempre fazê-la com segurança, sentia o volante nas mãos mais leve que o costume, sentia que em certas alturas quase que deslizávamos no piso escorregadio. Ao passar no lugar da Ribeira, ao fazer  uma ultrapassagem senti que bati em algo, mas rapidamente o Filipe me disse que tinha sido num espelho de uma carrinha e que pelo que via estava tudo bem, para seguir para a frente. Quem já passou por isto sabe do que falo, pois naquele momento só tinha em mente salvar a vida daquela jovem e quanto mais rápido chegasse ao hospital, mais probabilidades de vida ela tinha.
Finalmente chegávamos ao hospital, tínhamos uma equipa medica à nossa espera, e logo depois de termos feito toda a transmissão de dados que dispúnhamos, dei a indicação ao medico que muito provavelmente o ferido pior ainda estava para chegar, mas rapidamente me disse que esse ferido já não iria para lá, mas sim directamente para o hospital de S. João, e então rapidamente tive a percepção que realmente a outra jovem estaria bem pior do que a que transportamos.
Ao fim de algum tempo na sala de trauma e já com todo o nosso material livre, demos inicio à viagem de regresso, pelo caminho íamos comentando um com o outro a gravidade do acidente, pois tinha sido um embate violentíssimo, muito sinceramente nenhum de nós acreditava que alguma das jovens sobrevivesse.
Quando chegamos ao quartel, tínhamos a viatura num estado lastimável para limpar mas demos inicio ao nosso trabalho, e enquanto isso chegaram os nossos camaradas que tinham seguido com a outra jovem para o Porto, e acreditem que depois de os ouvir, fiquei com a certeza que a vitima deles estava bem pior que a nossa.
Foi um isto de emoções, de sentimentos, socorrer uma vitima de atropelamento provoca em mim certos calafrios, não é suposto ninguém ser levado à frente de um carro, não é suposto morrer-se desta forma, mas infelizmente nesta estrada EN-106, isto já é quase uma certeza acontecer com frequência.
Na minha viagem para casa já no meu carro, sentia-me impotente perante mais aquele acidente, não me saía da imagem aquela jovem, ali deitada na maca, indefesa, sem culpa nenhuma do sucedido a lutar pela vida, e sem querer, dei por mim a pedir a Deus que olhasse por aquelas duas jovens indefesas.


Infelizmente passadas duas semanas, veio-se a confirmar o pior desfecho, pois a jovem que tinha ido directamente para o S. João acabava por falecer não resistindo aos graves ferimentos.
Para mim a morte faz parte da vida, mas não desta forma, uma vida ceifada ainda muito jovem, mais uma vida a juntar a tantas outras. Sei que muito provavelmente muitas mais situações destas me iram aparecer pela frente, como já apareceram, mas não consigo ficar indiferente a tantos atropelamentos, ou por descuido dos condutores, ou por descuido dos peões, este tipo de acidente começa a tornar-se num flagelo que tem que ser combatido de alguma forma.
Da minha parte só tenho a dizer que tudo farei para prevenir este tipo de acidente, e tudo farei para socorrer quem precisa do nosso auxilio, quer seja numa situação destas, ou noutra qualquer, mas não se esqueçam, que a prevenção dos atropelamentos é de todos e não só de alguns, por isso previna, mas acima de tudo previna-se, atravessando sempre nas passadeiras, e tome sempre cuidado e verifique se tem alguma viatura a aproximar-se, pois a responsabilidade não é só dos condutores, mas sim de todos, quer sejam peões ou condutores.






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