Incêndio na Abilex provoca seis feridos - VIDA DE BOMBEIRO

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quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Incêndio na Abilex provoca seis feridos

 
24 de Setembro de 2006.
Estava de Ecin à noite e se não me falha a memória estávamos no bar a jogar cartas, era quase meia noite e o telefone tocou, pela hora não devia ser boa coisa. Passados dois minutos o chefe Vitorino chamou-nos da mesma forma de sempre, "meninos trabalhinho" e disse-nos para nos equiparmos para irmos ajudar os colegas de Paço de Sousa num incêndio urbano.
 
 
Rapidamente nos equipámos e saímos rumo ao local no VFCI-04.
 

Quando saímos do quartel não fazíamos ideia do que íamos encontrar, muito menos pensava que fosse na Abilex. Comecei achar estranho, porque ao passar nas Termas de S. Vicente já me cheirou muito a queimado, estava uma noite quente e por baixo do fato nomex já me sentia a transpirar e por isso levava o meu vidro aberto.
Achei mesmo muito estranho todo aquele cheiro, e pensei para mim mesmo que não podia ser, e comentámos isso mesmo uns com os outros. Como estávamos enganados!
Quando chegámos ao alto do Cêpo, chamou-me a atenção um clarão que se via para os lados de Paço de Sousa, e mais uma vez pensei que não podia ser, mas uma vez mais estava enganado.
Quando íamos a passar na Calçada as minhas duvidas dissiparam-se, aqui o cheiro que entrava pelo carro dentro já não enganava ninguém, este era com toda a certeza um incêndio de grandes dimensões. A partir daqui já me convenci que o cheiro que senti ao passar nas Termas já era proveniente deste mesmo incêndio.
Estava uma noite quente, apesar de estarmos quase no fim do mês de Setembro, e à medida que nos aproximavamos, o cheiro era cada vez mais intenso e o clarão de fogo cada vez maior.
Acabámos de nos equipar com todo o equipamento de protecção e rapidamente chegámos ao local.
Bem, quando chegámos, era o caos total, uma confusão de todo o tamanho, fiquei incrédulo a olhar para aquele cenário, que parecia ter sido tirado de um filme, o edificio estava todo tomado pelo fogo, havia carros por todo o lado, as mangueiras eram tantas que  passavam umas por cima das outras chegando ao ponto que as viaturas passavam por cima delas.
Fomos posicionados na parte de trás do edificio, também aqui a confusão era geral, a adrenalina tinha tomado conta de mim, e apesar do peso do ARICA (aparelho respiratório isolante de circuito aberto) eu praticamente nem a sentia às costas.
Foi nos dada a indicação para procedermos à montagem de uma escada e efectuarmos ataque defensivo. Estava eu a meio da escada quando o meu colega se lembra de abrir a água, e eu não tinha reparado que tinha a agulheta aberta e então acabei a cair para trás, caindo redondo de costas por cima do ARICA, felizmente não foi nada demais porque ainda não tinha subido muito na escada.
Passado algum tempo fomos chamados para entrar no edificio para se tentar efectuar ataque directo, coloquei a peça facial, e de agulheta em punho juntamente com o resto da equipa lá fui para o interior do edificio. As pernas tremiam-me como varas verdes, comecei a subir uma escadaria e o barulho do fogo era ensurdecedor, ouvia-se também o barulho de alguma da estrutura a cair, a minha respiração estava rápida demais, e rapidamente percebi que se continuasse assim iria ficar sem ar respirável dentro de pouco tempo, então parei, acalmei-me um pouco e olhei à minha volta, o fogo estava por todo o lado, e lá fora os colegas lançavam toda a água que podiam para tentar arrefecer um pouco o edificio, mas pouco ou nada havia a fazer. Ainda lá dentro tentei analisar alguns pormenores, como por exemplo a deformação do telhado que era toda em armação de ferro, e cheguei à conclusão que este iria ceder com toda a certeza e não iria demorar muito até que isso acontecesse. A temperatura era de tal forma elevada que mesmo o nomex já deixava trespassar o calor, levando-me a sentir que parecia que ia arder, e então decidimos sair porque além de nada se poder fazer, as condições de segurança eram quase nulas.
Voltamos para o exterior e para meu espanto o cenário estava ainda pior do que quando tinha entrado, tinham chegado mais carros vindos de outras corporações, tinham chegado auto-escadas e já se procedia à montagem das mesmas. Tudo isto em dez minutos, tempo este que estivemos no interior do edificio, continuamos com o ataque defensivo no exterior, e fui sabendo que alguns colegas já tinham sido transportados ao hospital com intoxicações por inalação de fumo, as coisas estavam mesmo feias e decididamente não valia a pena correr riscos.
Ao fim de algum tempo aconteceu o que já se esperava, as vigas de ferro cederam com o calor e o telhado acabou por cair, foi um barulho ensurdecedor, mais parecia uma bomba a rebentar, e aqui sim cheguei à conclusão que nada havia a fazer a não ser extinguir todos os detritos que ainda ardiam e fazer protecção de exposições, até porque havia um posto de combustível relativamente perto.
Daqui para a frente tudo foi reajustado, e a nossa missão passou a ser, efectuar arrefecimento até o incêndio se extinguir por carência (falta de combustível) e também a protecção de exposições.
Ao longo da noite fui-me apercebendo da dimensão dos estragos e da dimensão do perigo a que estivemos sujeitos, os meios envolvidos eram tantos que lhe perdi a conta, mas finalmente por volta das duas e meia da manhã, o incêndio estava extinto e iniciou-se com as operações de rescaldo.
Estava exausto, parei um pouco atrás do nosso carro e retirei o capacete e o Arica, que alívio, ao fim de quase 3 horas tive 5 minutos de descanso, bebi um pouco de água, limpei o suor da face e quando o nosso carro acabou de abastecer voltei ao trabalho.
A destruição era total, os escombros que se viam por entre o muito fumo que ainda havia não enganavam e davam a entender que nada tinha escapado à força do fogo.
Os mirones eram muitos, a comunicação social dirigiu-se em peso para o local, as autoridades andavam numa roda viva para manter toda a gente fora da zona de trabalho.
O rescaldo durou horas e prolongou-se pelo dia fora, felizmente para nós por volta das quatro da manhã fomos desmobilizados. A viagem de regresso durou pouco mais de quinze minutos, vinha cansado, muito cansado, permaneci com o nomex vestido pois a temperatura tinha descido durante a noite e eu estava completamente ensopado. Pouco falámos pelo caminho uns com os outros dado o cansaço e então muito rapidamente fiz uma análise do que tinha vivido nas ultimas horas, e pensei para mim, "este foi mesmo dos bravos mas felizmente já passou e tudo correu bem".
Passado pouco tempo chegámos ao quartel, finalmente podia tomar um banho, finalmente podia descansar.
 




  
 
É de lamentar que os bombeiros nos dias de hoje ainda não sejam vistos com outros olhos, sim porque nem toda a gente nos dá o valor merecido, mas nós, mesmo assim não deixamos de socorrer  quem precisa do nosso auxílio, porque somos "voluntários por opção, mas somos profissionais na acção" 
 

 Sou BOMBEIRO com muito orgulho
 
 


8 comentários:

  1. Olá Filipe, para mim também foi o "pior" incêndio (em todos os sentidos) que tive em toda a minha carreira, ainda no presente, tenho noites em que acordo com aquelas imagens na minha memoria...

    Duro muito duro...

    Pedro Mike

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  2. Olá Pedro, sim é verdade foi duro demais, mas nós nunca desistimos de tentar fazer alguma coisa naquela noite, e por isso mesmo estámos de todos de consciência tranquila.
    Grande abraço Pedro.

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  3. Boas Filipe, eu também estive nesse incêndio, quando se iniciou esse incêndio estava na minha central, conseguia-se ver o incêndio perfeitamente, saiu no meu VRCI 08 com mais 4 elementos, foi um incêndio daqueles...


    Óscar Rodrigues

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  4. Olá Óscar, sim é verdade este foi um daqueles incêndios que nos põe a pensar, e eu falo por mim, quando me lembro deste incêndio dou por mim a dizer para mim próprio "bem mas que sorte que nós tivemos"
    Felizmente tudo correu bem.
    Grande abraço Óscar.

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  5. Oi Filipe
    esse foi dos grandes! Excelente trabalho de equipa, e depois deste de certeza que n voltaste a esquecer de confirmar de a agulheta esta aberta ou fechada.
    Felizmente tudo correu, mas é realmente estranho como é que uma fabrica de dimensões tão grandes pegou fogo generalizado em tão pouco tempo. Houve mão criminosa nisso. Ficou impune?
    Bjs
    Mafalda

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    Respostas
    1. É verdade Mafalda este foi dos valentes.
      Agora verifico sempre agulheta, serviu-me de lição.
      Bj

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  6. Ola grande noite sim senhora :P

    fizeram um bom trabalho, orgulho-me de voces....



    Bárbara Martins

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