Incêndios: “A População Não Está Minimamente Preparada” - VIDA DE BOMBEIRO

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quarta-feira, 27 de março de 2019

Incêndios: “A População Não Está Minimamente Preparada”


Só durante o dia de ontem foram registados mais de cem incêndios. Eduardo Cabrita e Luís Capoulas Santos assinaram um despacho para ativar a situação de alerta. Governo proibiu queimadas.

As temperaturas altas chegaram mesmo antes da primavera e, além das idas à praia em pleno mês de março, o calor trouxe também as chamas. O tema é delicado, sobretudo quando se recordam os incêndios dos últimos dois anos que atingiram grandes proporções.

A Autoridade Nacional de Proteção Civl (ANPC) fez as contas e só ontem foram registados 121 incêndios rurais. No final do dia estavam ainda ativos nove incêndios e havia mais de 500 homens no terreno a combater as chamas. Face à situação, Luís Capoulas Santos, ministro da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural, e Eduardo Cabrita, ministro da Administração Interna, assinaram ontem um despacho que determinou a declaração da situação de alerta. Em comunicado enviado à imprensa, a tutela apontou “medidas de caráter excecional”, como a “proibição da realização de queimadas, de queimas de sobrantes de explorações agrícolas e florestais e de ações de gestão de combustível com recurso à utilização de fogo”.

Os fogos em Pinheiro da Bemposta, concelho de Oliveira de Azeméis, e em Penafiel foram os maiores e mais preocupantes. As chamas consumiram, essencialmente, mato, pinheiros e eucaliptos. Às temperaturas invulgarmente elevadas para esta altura do ano somam-se outros fatores – queimadas, limpeza dos terrenos e força do vento.

Contactado pelo i, Emanuel Oliveira, analista de gestão de risco de incêndio, explica que os incêndios nesta época do ano são normais e correspondem a cerca de 40% da área ardida anualmente. “Incêndios de primavera existem e existiram sempre, por exemplo, de 2001 a 2010, a percentagem [de incêndios na primavera] está entre os 20 e os 25%”, diz Emanuel Oliveira. De acordo com o Sistema de Gestão de Informação de Incêndios Florestais (SGIF), foram registadas 1894 fogos rurais desde o início do ano.

Focando a atenção nos incêndios dos últimos dias, é possível perceber que grande parte das ocorrências se registam durante a noite. Por exemplo, o alerta do incêndio de Oliveira de Azeméis foi dado às 3h32 da madrugada desta terça-feira. Ainda que as queimadas sejam responsáveis por parte dos fogos que lavram durante o período da primavera – esta prática só é proibida em época de incêndio -, Emanuel Oliveira não acredita que estejam na origem dos incêndios que começam em período noturno. Desde o dia 23 até ontem, “31% das ocorrências dão-se entre as 20 e as sete horas da manhã”. “Há aqui outras intenções, não acredito muito que seja por queimadas, que ninguém vai fazê-las a estas horas”, refere o especialista, que adianta que cabe agora às autoridades responsáveis “investigar as causas, mas havendo um registo de queimadas é mais fácil chegar à causa”. Outra das especificidades apontadas pelo analista é que estes incêndios estão “a ocorrer em zonas rurais, mas de maior densidade populacional – são incêndios mais complexos”.

A partir do momento em que um incêndio começa, há outros fatores que influenciam a propagação e o destino do fogo. O vento forte e seco que se tem feito sentir nos últimos dias não ajuda o combate, além de que os terrenos que ainda não estão limpos são zonas onde o fogo dificilmente é controlado.

Proibição de queimadas Face às condições meteorológicas dos últimos dias, vários municípios do país anteciparam a decisão do Governo e alertaram a população para o perigo das queimadas. O Serviço Municipal de Proteção Civil de Guimarães – município onde estão, aliás, quatro freguesias assinaladas como primeira prioridade pelo ICNF –, alertou ontem para a restrição de queimas até dia 2 de abril. Além das queimadas, o alerta para as medidas preventivas centra-se também na restrição da “realização de fogueiras para recreio ou lazer, ou para confeção de alimentos”, avança a Câmara Municipal de Guimarães em comunicado. Na mesma linha está também o município de Braga, que determinou a proibição de queimadas desde o dia de ontem – período que se estende, para já, até ao primeiro dia de abril.

A decisão abrange todo o território nacional e surge também na sequência do aviso à população da ANPC, onde são referidas as subidas de temperatura “acima do habitual para esta época do ano”. A ANPC recorda que “os locais onde o índice de risco temporal de incêndio seja de nível muito elevado ou superior” devem ter em conta que “as queima de matos cortados e amontoados e qualquer tipo de sobrantes de exploração está sujeita a autorização da autarquia local”.

Em matéria de risco de incêndio, o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) atribuiu risco máximo de incêndio ao município de São Brás de Alportel (Algarve) e marca no mapa 22 municípios com risco elevado. No mapa do ICNF a mancha verde por estes dias é pequena – são apenas 19 os municípios com risco reduzido.

No entanto, esta questão pode dar origem a outro problema – as queimadas ilegais. “Se condicionamos muito, as pessoas vão querer livrar-se, muito por força da lei, do amontoado de combustíveis”, explica Emanuel Oliveira. Além disso, de acordo com o analista de gestão de risco de incêndio, existem outras motivações: “Uma vez que não têm dinheiro para limpar as faixas, há pessoas que colocam fogo, isso fica muito barato”.

As zonas onde o registo de incêndios é mais elevado são, essencialmente, rurais e habitadas por uma população envelhecida. Como explica Emanuel Oliveira, “há uma cultura de risco que temos de assumir e que Portugal ainda não assumiu”. E vai mais longe: “A população não está minimamente preparada e não sabe viver com o risco”.

Fonte: Jornal i

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