Já Todos Esqueceram o Caramulo e Pedrogão? - VIDA DE BOMBEIRO

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segunda-feira, 13 de agosto de 2018

Já Todos Esqueceram o Caramulo e Pedrogão?


Um ano se passou desde a fatídica miséria de 2017...ano que poderia ter marcado a viragem no paradigma dos Bombeiros Portugueses...
Nascia uma Federação embrionária que aparentemente tentava trazer a si a união de profissionais e voluntários, dando voz aos Bombeiros e não só a quem os representa...e nós, acreditámos que podia ser possível...mas uma vez mais, outros valores se levantaram...e o resultado...está à vista!! 
Profissão: Bombeiro…que futuro nos espera?

O ano de 2017 revelou-se o mais dramático de que há memória no que concerne aos incêndios florestais, contabilizando-se mais de cem mortes, que trouxeram à luz do dia inúmeras fragilidades no seio das estruturas envolvidas, estimulando novos estudos e debates sobre problemas bem antigos e devidamente sinalizados. Tudo isto sob a habitual passividade de quem todos os anos assiste aos mesmos erros sem reverter este ciclo vicioso desde há muito instalado.

Devido à dimensão desta verdadeira catástrofe, tornou-se assim incomportável continuar a esconder as falhas, no tão habitual descartar de responsabilidades, dando-se início a um enorme processo de análise aos factos ocorridos, no sentido de identificar onde, quando e principalmente, quem falhou. Nesses estudos e relatórios apresentados pelos mais conceituados analistas da área (pelo menos do que é passível de ser divulgado), constam obviamente graves problemas dentro da estrutura dos Bombeiros, INEM e forças de segurança, entre falhas nas comunicações, na gestão dos meios e dos T.O’S e até no próprio combate.

Posto isto, o Governo apressou-se a anunciar medidas megalómanas sobre a contratação de elementos para a ampliação das forças já existentes, com aspirações à quase duplicação dos efectivos e até à própria criação de novas estruturas que aparentemente virão fazer aquilo que nós Bombeiros supostamente não conseguimos fazer…faltando dizer o… PORQUÊ?

Os últimos desenvolvimentos apontam para uma vontade política muito activa no sentido de dar início à tão badalada profissionalização dos Bombeiros, deixando-nos sérias dúvidas se estarão devidamente enquadrados com a realidade do sector. Saberão efectivamente a quem é que já pagam indirectamente para ser profissional? Quantos é que são, quem os gere e como é que se faz essa gestão de meios humanos e materiais pagos pelo erário público?

Não, não sabem…ou não querem sequer saber.

De há uns anos a esta parte, face ao exponencial crescimento demográfico na periferia das grandes cidades, tornou-se imperioso criar estruturas de apoio ao voluntariado cada vez mais fragilizado, de forma a dar resposta às inúmeras lacunas de índole operacional dentro das Associações de Bombeiros. Foram assim criadas as EIP’s/GIPE’s, comparticipadas pelas autarquias locais mas contratadas pelas entidades detentoras dos Corpos de Bombeiros com cláusulas acordadas entre as partes de forma a servir os interesses comuns, que raramente são os reais interesses dos Bombeiros e que desta forma mascaram as verdadeiras fragilidades do sistema.

É aqui, neste universo de homens e mulheres que um dia optaram por ser Bombeiros a tempo inteiro, que se erguem as primeiras vozes sobre algumas das falhas mais graves no seio da sua própria estrutura. Estes elementos, muitos deles já com várias dezenas de anos de serviço operacional, formados e certificados nas mais variadas valências, devido a uma má gestão, falta de responsabilidade operacional e outros tantos interesses políticos e financeiros, vêem-se arredados da linha operacional em prol de serviços secundários. Com um intuito meramente financeiro por parte das direcções, vêem-se subjugados pelas ditas cláusulas contratuais que supostamente prevêem esta utilização indevida dos meios de resposta imediata pondo em causa uma correcta prestação do socorro. Uma prática corrente, paga e validada pelo poder local que fecha os olhos às irregularidades alegando não ser da sua responsabilidade essa gestão. Mas é! Pois é das finanças públicas e do dinheiro dos contribuintes que sai o principal montante para assegurar estas equipas, que deveriam estar formatadas para actuar em incêndios de toda a natureza, acidentes, inundações, com tempos previstos para a manutenção da sua condição física, formação e treino em contexto de trabalho, para conhecer cada equipamento, cada milímetro da sua área, de forma a poder dar resposta às mais variadas situações com que diariamente se deparam.

Contrariamente ao que seria de esperar, durante todo o ano se assiste a uma utilização abusiva dos meios humanos mais qualificados dos Corpos de Bombeiros, em serviços de transportes não urgentes, protocolos assumidos para garantir transferências inter-hospitalares, formações e prevenções a escolas e empresas, transportes escolares, etc., e um sem número de outros serviços que infelizmente fazem parte do panorama diário.

As próprias Associações, comodamente contempladas com estes recursos subsidiados pelo Estado, abdicam de fazer contratações para assegurar o serviço pré-hospitalar, fazendo-o apenas para o transporte de doentes não urgentes. Sistematicamente, recorre-se aos grupos de primeira intervenção sem qualquer relutância, mesmo tendo presente os riscos inerentes a essa tomada de decisão. Perante este cenário, estes grupos vêem-se forçados a operar no terreno com metade do seu efectivo ou até menos, comprometendo não só o sucesso das operações de socorro, como também pondo em causa a sua própria segurança.

Como se não bastasse, com a chegada do Verão, o cenário tende a agravar-se. A ilusória sensação de reforço operacional proporcionada pelo início da actividade das ECIN, aliada à redução de profissionais por motivo de férias, acaba por fomentar ainda mais o recurso aos operacionais das EIP’s/GIPE’s para outros serviços, remetendo para as ECIN todo o ataque inicial, muitas das vezes até para fazerem o trabalho das próprias EIP’s/GIPE’s. Há que tornar público que as equipas ECIN, principalmente nos turnos diurnos, são formadas maioritariamente por Bombeiros voluntários em período de férias, Bombeiros recém-formados ainda à espera do primeiro emprego ou Bombeiros em situação profissional precária que, salvo raras excepções não terão a mesma experiência dos colegas cuja actividade é ser Bombeiro todos os dias! Sejamos claros, estamos a mandar recém-formados para a primeira linha de combate, estamos a mandá-los em GRIF’S, para os cenários mais dantescos do nosso País!

Já todos esqueceram o Caramulo?

Não se honram aqueles que lá ficaram e os que vieram feridos?

Não se aprendeu nada com isso?

Se isto já é grave nos Corpos de Bombeiros que operam em áreas de actuação de interface urbano-rural, permitindo que os incêndios atinjam dimensões preocupantes antes do accionamento de triangulações ou de GRIF’S, noutros, essa resposta torna-se simplesmente catastrófica, devido ao ataque inicial não ser devidamente musculado. E não falamos apenas de incêndios!

É prática comum ver Corpos de Bombeiros cuja capacidade operacional permitiria enviar um contingente significativo de meios com uma equipa profissional inserida no ataque inicial, mas que por utilização indevida dos profissionais, acabam por ficar com os veículos sem tripulação nos quartéis. Chega-se ao cúmulo de se tocarem os alarmes externos (sirene), com as guarnições das EIP’s/GIPE’s a verem partir os voluntários, ficando à espera de um hipotético accionamento para uma emergência pré-hospitalar ou serviço de consulta que podem nem chegar a existir. Continuamos negligentemente a permitir que as ditas EIP´s/GIPE’s, sejam abusivamente utilizadas noutras áreas quando deveriam fazer parte integrante e imprescindível dos primeiros meios de resposta a qualquer sinistro.

Bombeiro Profissional…?

Será este o nosso futuro?

Agora que os tempos são de mudança, é altura de mostrarmos que o caminho é feito lado a lado, perseguindo objectivos comuns, com carreiras comuns, formação e reconhecimento profissional comuns, independentemente das siglas ou da cor das nossas fardas.

É neste contexto, que conscientes da falta de visão da tutela, aliada ao medo que as entidades detentoras dos C.B.’s têm de perder as suas “coutadas” pessoais, nós, Bombeiros Profissionais das Associações, esperamos desta Federação o devido apoio e reconhecimento enquanto Bombeiros Profissionais que somos por direito, defendendo um futuro mais consistente para todos, sem medo de represálias.

Nós, que diariamente asseguramos todas as intervenções nas nossas áreas de actuação, de forma organizada e extremamente profissional, não contando com a intervenção directa de outras forças (como FEB, GIPS, Sapadores Florestais, outros…), não julgamos ser justo, sequer pensar na hipótese de virmos a ser substituídos na primeira intervenção por qualquer uma destas forças ou outras que possam vir a ser criadas.

É preciso expor os podres que fragmentam e fragilizam a imagem dos Bombeiros Portugueses sem medo de beliscar acordos e protocolos dos quais temos saído sempre a perder.

É preciso perguntar como é que um Instituto arrecada quase 100 Milhões de euros por ano em seguros, colocando com sorte, uma ambulância com 2 homens num acidente quando os Bombeiros, com desencarceramento, várias ambulâncias e a responsabilidade das operações, não vêm um cêntimo chegar directamente às suas mãos.

É preciso dizer que se querem ter a gestão da emergência médica têm de se munir de mais meios, têm de apoiar mais os seus parceiros em meios técnicos e principalmente humanos. Têm de ministrar a mesma formação a todos e chamar todos pelo mesmo nome de forma a padronizar competências e protocolos de actuação. É preciso que veículos e tripulações com o mesmo fim obedeçam às mesmas regras para não criar a ideia de um socorro a dois tempos. Não se pode continuar a ver os Bombeiros a deixarem de fazer as suas funções para servir os lobbies dos outros.

É preciso perguntar à tutela quando é que se começam a fiscalizar os C.B.’s que têm equipas pagas pelo Estado, aparecendo sem pré-aviso de forma a desmascarar as irregularidades. É preciso criar legislação específica para estas equipas, definindo com clareza onde, quando e em que circunstâncias devem actuar, baseando-se nas reais funções dos Bombeiros e não no sustento das Associações com fins mais ou menos claros. É preciso desmistificar os medos e provar por A+B que aqui são precisos 10 e ali são precisos 15, com contas feitas à densidade populacional, área geográfica e pontos sensíveis, sem manipulação de interesses políticos ou pessoais. É preciso fazer ver que profissionalizar não tem de ser sinónimo de extinção do voluntariado, é apenas uma forma de garantir a eficiência do socorro.

É preciso mostrar que a palavra Bombeiro, tem que ter o mesmo peso dentro e fora do país, com a mesma interpretação legal e com o mesmo grau de confiança.

Se juntos, somos mais fortes… é chegada então a hora de mostrarmos de que fibra são feitos os Bombeiros Portugueses!

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