"Custa-me muito falar disto, mas não se pode esquecer o que aconteceu" - VIDA DE BOMBEIRO

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segunda-feira, 18 de junho de 2018

"Custa-me muito falar disto, mas não se pode esquecer o que aconteceu"


Há um ano, Rui Rosinha e Filipa Rodrigues quase perderam a vida num acidente com o carro de bombeiros em que seguiam. O colega Gonçalo morreu. Eles sobreviveram para contar a história.

Há um ano, neste 17 de junho, cinco bombeiros seguiam numa viatura que colidiu com um ligeiro na estrada nacional 236, via onde morreram 47 pessoas.

Dentro do carro dos bombeiros, estava o chefe Fernando Tomé, o subchefe Rui Rosinha, Fernando Paulo Tomé e Filipa Rodrigues, que ficaram feridos. Estava também Gonçalo Correia, que viria a morrer.

Um ano depois, Rui Rosinha e Filipa Rodrigues recordam memórias dolorosas. Têm um objetivo: querem que o que aconteceu nunca caia no esquecimento.

Rui Rosinha chega ao quartel de Castanheira de Pera na motorizada elétrica, com encosto para as costas e apoio para os pés, e com um cesto à frente, onde guarda uma garrafa de água. Faz calor e traz a cabeça coberta por um chapéu de palha para fazer sombra. Ainda não consegue dar mais do que meia dúzia de passos.

"Estive quase três meses em coma, estive seis meses no hospital, onde só me levantei uma vez ou duas, perdi muita massa muscular, foi-me retirada massa muscular para encher umas úlceras de pressão que tive nas ancas, fiquei com uma algoneurodistrofia nos pés, com uma dor neuropática que me faz doer os pés ao caminhar... Tudo isto influencia a recuperação. A lesão no plexo do braço esquerdo não ajuda nada, a atrofia da mão esquerda também não". A lista de problemas é extensa. Por isso, conclui: "Preciso de trabalhar isto tudo".

Na fisioterapia, vai melhorando gradualmente. Internado até dezembro, Rui diz que esteve "seis meses do lado de lá" e agora está há seis meses "do lado de cá". Mexer nas memórias daquele dia é uma coisa que lhe dói, mas ele insiste em fazê-lo: "Tenho como missão não deixar que isto se esqueça, porque faleceu tanta gente, morreram pessoas que me diziam muito e tenho família e grandes amigos nos bombeiros, portanto isto não pode tornar a acontecer de maneira nenhuma. Se tornar a acontecer, não se aprendeu nada".

É por isso que Rui Rosinha fala. Para passar a mensagem de que é preciso prevenir, cuidar da floresta, apostar na formação, tratar da natureza. "Falhámos todos. Falhei eu, falhou o meu vizinho, falhámos todos", analisa.

Gonçalo, que também ia no carro com Rui, não resistiu aos ferimentos. Acabou por morrer no hospital. O chefe Tomás sobreviveu, depois de ter passado por um coma. Filipa Rodrigues também. Tem 21% do corpo queimado. "Nunca vamos esquecer aquele dia, nunca vamos esquecer a perda de um colega, nunca vamos esquecer o sufoco que tivemos, o que tememos. Ficámos numa situação muito débil. E naqueles primeiros meses foi tudo umas incertezas atrás de outras", recorda.

Filipa diz ter noção de que há um ano, neste 17 de junho, os bombeiros de Castanheira de Pera "não estavam preparados" para o que aconteceu. Agora, só insiste num ponto: é preciso que os voluntários tenham "mais formação e mais meios".

TSF


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