Bombeiros e Proteção Civil: estado da arte
Para poder falar desta realidade e tentar perceber o modelo atual que se quer para os bombeiros, vou fazer um pequeno resumo do estado da arte:
Realidade atual
Bombeiros Sapadores: há falta de pessoal, de equipamentos, estatuto profissional, situação esta que se tornou normal desde o ano de 2002.
Bombeiros municipais: o cenário repete-se, mas com a agravante de algumas centenas de assistentes operacionais e assistentes técnicos que exercem as funções de bombeiro e que não estão na carreira adequada nem com o vínculo adequado.
Força Especial de Bombeiros: cada vez são menos, faltam equipamentos, estatuto profissional, situação esta que decorre desde a data da sua criação.
Bombeiros Profissionais das Associações Humanitárias: sem carreira, sem acordo coletivo para o setor, problemas laborais e conflitos entre o que é o trabalho em voluntariado e o trabalho como profissional, o mesmo de sempre.
EIPS: estão a ser criadas mais equipas de intervenção permanente nos corpos de bombeiros, mas uma equipa não trabalha 24 horas sobre 24 horas. Continuamos a “achanatar” a profissionalização, para não falar no tipo de contrato destes bombeiros e da sua salvaguarda laboral.
Bombeiros Voluntários: cada vez em menor número, e quando falo em bombeiros voluntários são aqueles que são mesmo só voluntários.
Sapadores Florestais: uma realidade que já existia, mas que agora vemos surgir com precaridade laboral, contratos em regime de avença, alguns promovidos por autarquias, quando o país está a regularizar os trabalhadores precários da função pública não se entende a razão pela qual não são considerados uma necessidade permanente. Mais uma vez, estamos a “achanatar”!
Os operacionais que prestam serviço no CDOS e no CNOS, sem carreira, estão numa grande precaridade laboral, uma grande confusão onde chegamos ao ponto dos CODIS e sua estrutura estarem também eles em precaridade.
Escola Nacional de Bombeiros: nem vale a pena falar. Mantém a indefinição de sempre.
No final de tudo isto, vemos a evolução que decorre do compromisso nacional que todos os responsáveis políticos assumiram após a catástrofe que foram os incêndios de 2017. Passamos às medidas positivas para o setor:
- Integração de mais 600 elementos da GNR nos GIPS e SEPNA: sendo uma medida positiva para a GNR, em nada resolve os problemas das estruturas anteriormente referidas. Com esta medida, continuamos na mesma.
- Aprovação de legislação que dá competências às autarquias e responsabiliza os municípios para garantirem a fiscalização da limpeza e manutenção das faixas de segurança. Esta medida também não resolve os problemas anteriores. É boa para o país, mas as autarquias, através da Associação Nacional de Municípios Portugueses, contestam medida e já se estão a por de fora.
Para culminar e resolver o problema de falta de bombeiros, sejam eles sapadores, municipais, profissionais das associações humanitárias e até mesmo sapadores florestais, são criadas as “cabras sapadoras”. Trabalham 24 horas, voluntariamente, não reclamam carreiras, horário extraordinário, higiene e segurança no trabalho, equipamentos, não são encargo para a segurança social nos regimes de reforma e aposentação, não reclamam carreira de risco e de desgaste rápido…uma boa medida, se tudo o resto que está mal, também tivesse a celeridade e o arrojo nas medidas que são necessárias implementar.
Como dizem os bombeiros municipais, e bem, “só nós, bombeiros municipais, é que não podemos ser sapadores, porque até as cabras já o são”!
A vergonha continua e o setor continua a não valorizar os seus homens e mulheres, que são eles o pilar fundamental do socorro.
Todos nos já percebemos que está criada uma grande confusão com tudo isto. As medidas propostas por todos para o setor- onde se inclui a Comissão Técnica Independente- apontam para a profissionalização e, ao contrário do que devia ser, vemos mais precaridade laboral, vemos carreiras indefinidas, o completo oposto do que é uma estrutura profissional de socorro.
Uma profissão não é só o vencimento. Uma profissão tem requisitos. Não posso aceitar que os mesmos de sempre, que estão no setor há dezenas de anos, invoquem questões económicas para justificar a manutenção do modelo atual de funcionamento dos bombeiros.
Será que os responsáveis políticos acham que a profissionalização do setor, tal como indicam todos os relatórios, é uma questão de nome e por isso chamaram “cabras sapadoras” e não apenas cabras? Será, afinal, a profissionalização apenas uma questão do nome que se dá às coisas? Se as “cabras sapadoras” morrerem em combate, não vão ser notícia de primeira página nem vão ser incómodo para o poder político e a sua família não terá direito a indemnização.
Problema resolvido!
Por último, como bombeiro sapador de carreira, refiro o seguinte: imaginem se os bombeiros sapadores também arranjassem um nome para os políticos profissionais que intervêm no âmbito dos incêndios florestais?
“Quem não se sente, não é filho de boa gente”!
Sérgio Rui Carvalho
Presidente do SNBP
" IN JORNAL ALTO RISCO "
jan/fev 2018
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