Dizem-se impotentes e deixados sem liderança por um comando que não soube planear de acordo com a meteorologia, nem com as lições de Pedrógão. Afinal, explicam nos quartéis de bombeiros, os meios que existiam para apagar os fogos em setembro são os mesmos que existem em outubro, mas não foram mobilizados porque não houve planeamento.
“Quanto tempo demorou um grupo de reforço de Setúbal a chegar a Lousã? Porque reduziram os meios aéreos e porque não há mais meios aéreos pesados se sabiam que a meteorologia era desfavorável?”, questiona-se nos quartéis. “Andamos a prolongar o dispositivo de combate a conta-gotas. Enquanto Espanha prolongou até final do ano nós prolongamos agora 15 dias, depois mais uma semana e assim, por mais voluntários que tenhamos, não se consegue planear uma resposta”, afiança o presidente da Associação Nacional de Bombeiros Voluntários.
Rui Silva garante que muitos dos bombeiros “estão disponíveis e viram os fogos pelas televisões sem terem sido mobilizados. Afinal se temos 28 mil bombeiros e só 5 mil estão a combater os fogos onde estão os outros?”, questiona o dirigente. Mesmo o argumento da ocupação noutros serviços não colhe: “o problema é que as associações de bombeiros profissionalizaram o transporte de doentes mas não cuidaram do socorro e como são entidades privadas o Estado pouco pode exigir e esse é um dos aspetos que esta tragédia tem que servir para corrigir”, adianta.
As críticas e os desabafos são feitos a quente, por profissionais de combate aos incêndios dispersos por todo o país. Em Sinta, os voluntários dão razão ao presidente da Associação Nacional de Bombeiros. António Calinas, de Alcabideche, lamenta “a falta de solidariedade demonstrada por vários dirigentes”. Este bombeiro lembra que “os incêndios também se combatem com material sapador e existem muitos bombeiros nos quartéis e em casa que poderiam estar no terreno”, diz o bombeiro a quem “pouco ou nada interessa se a ANPC existe, se está em convulsão ou mesmo se já está morta. Os Bombeiros são o bastião do socorro às populações e podem e deviam ter sido mobilizados”.
Em causa os alertas meteorológicos e “o deficiente planeamento. Já sabíamos que íamos ter um outono quente e desmobilizámos o dispositivo. Mandámos embora os nossos helicópteros e depois pedimos emprestados a outros países, desmobilizamos os bombeiros e depois andamos a dizer que não há”, conta Hermenegildo Martins, antigo comandante dos bombeiros em Penedono. Desde o princípio do mês que existem menos 4 mil homens, menos 30 aeronaves e menos 800 viaturas. E terá sido a desmobilização do dispositivo de combate a maior causadora do agravamento dos fogos. “Não ligamos às previsões e não sabemos prevenir. Todos estes fogos, mesmo que sejam mais de 500, são passiveis de resposta mas não houve foi planificação em face do tempo quente”, acusa o presidente da Associação de Bombeiros Voluntários. Mário Marques, especialista em riscos naturais, avaliza. “Usamos modelos que não compensamos com observação e quando temos esse conhecimento disponível não o sabemos utilizar”. Foi o que sucedeu em Castro Daire, onde o fogo de Casais do Monte foi travado com os poucos bombeiros disponíveis. Apesar das previsões meteorológicas desfavoráveis a máquina de rastos disponível estava avariada e teve que ser reparada antes de poder ser mobilizada”, diz um dos operacionais que esteve no fogo, que alastrou ao concelho de Viseu.
Também as lições de Pedrógão não foram apreendidas, dizem, como sucedeu na Lousã. “Tivemos uma frente de 20 km de fogo com as comunicações suportadas num único canal de manobra”, conta um dos bombeiros que ali esteve. Este chefe aponta outra dificuldade nestes fogos tardios: “podemos ter muitos meios disponíveis, mas se não tivermos um posto de comando arrumado acabamos por receber meios de reforço que depois ficam ali sem missão atribuída”. Uma alteração “que não faz sentido porque acabamos por não ver 'a toca de onde sai o coelho', não conseguimos implantar uma estratégia e leva-la de forma consequente”.
Em causa aquilo que um bombeiro na Lousã apelida de “muitos chefes para poucos índios, temos muita gente a mandar, no nível estratégico e pouca a executar, no nível tatico. Mestres florestais afiançam que “os fogos têm tomado grandes proporções pois os autotanques não sobem as serras e quando acaba a mangueira o fogo continua”. “Porque se continua a querer combater este tipo de incêndios com ataque direto quando isso é impossível nestes casos” Por todos os quarteis há ainda a questão dos carros ardidos. “Como se explica que, só na Sertã, tenham ardido 3 veículos? Usamos viaturas que compramos em segunda mão, vindos de todo o lado da Europa? Se não são bons para eles são bons para nós?”.
Fonte: Expresso
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