Opinião: Cair pelo Dr. - VIDA DE BOMBEIRO

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sábado, 16 de setembro de 2017

Opinião: Cair pelo Dr.


No dia seguinte à tragédia de Pedrógão Grande, onde morreram 64, 65 ou 66 pessoas, conforme os critérios de morte direta ou indireta, como se isso fosse relevante, pediram-se demissões e a assunção de responsabilidades. Ninguém assumiu fosse o que fosse. Ninguém se demitiu. Nem que fosse por respeito simbólico.

Nos dias seguintes à tragédia de Pedrógão Grande, o país continuou a arder sem controlo. Repetiu-se a descoordenação. A falta de meios. As sandes de pão com pão dadas aos bombeiros ou as refeições de arroz com arroz do mesmo. Pediram-se demissões e a assunção de responsabilidades. Ninguém assumiu fosse o que fosse. Ninguém se demitiu.

Caiu agora. Rui Esteves, comandante operacional nacional da Proteção Civil desde dezembro quando começaram a ser substituídas 20 das 36 chefias, depois de ter resistido aos fogos, de ter recusado à ministra pedir a demissão quando se soube que acumulou as funções de comandante com as de diretor do aeródromo de Castelo Branco.

Caiu porque se licenciou em Proteção Civil, tendo, tanto quanto se sabe, feito apenas quatro das 36 cadeiras, obtendo equivalências nas restantes através do mágico fator "universidade da vida".

Há uma estranha vocação para se tirarem cursos apressados em Portugal. Mas mais estranho ainda é o país onde se paga mais pelo ridículo do que pela responsabilidade política. E seria impensável ver nesta demissão uma antecipação da conclusão de uma miríade de relatórios, cujos terão um responsável operacional que o Governo escusa de demitir, porque já está demitido, e mais ninguém precisa de ser demitido, porque já há um demitido. E ao demitido não se pede o contraditório, porque pouco importa o que contradiga. Parece confuso, mas não é.

Tudo isto três meses depois de uma tragédia para a qual, como se conta hoje no JN, ainda não há respostas definitivas ou responsabilidades atribuídas. Mas não faltam auditorias, estudos, pareceres e relatórios, com poucas conclusões e alguns adiamentos. Das conclusões.

Tudo isto enquanto se sucedem os aproveitamentos políticos no terreno, os atrasos na reconstrução, ou as suspeições lançadas sobre os donativos, numa das intrigas mais reveladoras da falta de respeito pelo luto, que a ninguém dignifica. E que pode ter sido uma das maiores machadas no espírito de solidariedade que ainda resiste no país.

Domingos de Andrade* DIRETOR-EXECUTIVO
Fonte: JN

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